Como eu aprendi inglês

03 de Maio, 12H40

Eu me lembro perfeitamente da minha primeira experiência com o inglês. E hoje eu vejo como essa experiência viria ser decisiva para a minha escolha de me tornar professora.

Eu tinha 9 anos e minha família e eu fomos visitar meus avós em Caruaru, Pernambuco. Do outro lado da rua em que meus avós moravam, vivia um homem holandês. Meus avós me pediram mais de uma vez para que eu não interagisse com ele, porque ele não falava sequer uma palavra em português, ele falava inglês, quando precisava se comunicar com alguém. Eu, no auge dos meus 9 anos em que tudo parece um desafio, vi aquilo como mais um e fiquei vidrada na ideia de falar com ele! Mesmo que fosse só pra ouvi-lo falando outra língua!

E aquilo transformou inteiramente o tempo que eu passei lá: eu passava grande parte do meu tempo brincando com as crianças locais, que, não tão carinhosamente, me apelidaram de “paulistana arretada” já que eu ficava possessa toda vez que me zoavam pelo meu sotaque diferente; e o resto do meu tempo era dedicado a uma campana implacável na frente da casa do estrangeiro na esperança de vê-lo na rua!

E então, isso finalmente aconteceu! Eu o vi sentado na calçada em frente à casa dele. Eu fiquei tão feliz, mas muito apreensiva, também: o que raios uma menina poderia dizer para um homem que nem sequer fala sua língua?!
Eu parei e pensei um pouco. E então tomei uma decisão: eu iria falar que a casa dele era bonita. Pensei isso, porque eu sabia que seria simples de falar e também porque era bem verdade: a casa dele era a maior e a mais bonita da rua.

Para isso, eu tive que agir rápido! Saí correndo até a casa dos meus avós e perguntei para minha mãe: “Mãe, como eu digo ‘casa’ em inglês?”. Ela traduziu sem se preocupar com o que eu faria com aquilo. E eu fui praticando “house” até voltar à calçada. Eis que eu me toquei: “Mas como que eu digo ‘bonita’?”. Voltei para dentro de casa e perguntei mais essa palavra. Minha mãe simplesmente a traduziu e até me ajudou com a pronúncia!

Voltei então para a rua repetindo mentalmente (“house beautiful, house beautiful”). Eu estava tão nervosa que eu pensei mais de uma vez em desistir, mas eu continuei andando até, então, chegar à calçada.
Para a minha total decepção, ele já tinha voltado para dentro de casa. Pior: ele viajou naquela noite e eu não o vi mais!

Mesmo com esse desfecho, essa experiência fez algo despertar dentro de mim naquele dia.
Eu fiquei completamente apaixonada por outros idiomas e outras nacionalidades! A partir daquele dia, qualquer chance que eu tive de estar em contato com esse novo mundo, eu aproveitei!

Eu voltei para São Paulo e logo comecei a dar aulas de “inglês” para os meus brinquedos. Eu sabia muito pouco (senão nada), mas minhas bonecas não se opunham às minhas aulas!
E aí começou o meu aprendizado: por meio de contato constante! Por meio de músicas (principalmente da Madonna), de filmes legendados (que eu assistia com a minha mãe), de livros da escola e 13 anos depois, eu me graduei em Letras, Tradução e Interpretação.

E enfim chegou o momento: eu iria dar aula! Uma aula de verdade, com pessoas de verdade. Que adrenalina e até uma certa ponta de medo, mas eu me preparei tanto para aquele momento. E, mais uma vez, como quando eu tinha 9 anos, eu fui em frente. E lá veio a emoção de estar à frente de uma sala de aula, de ajudar os alunos a ter aquele estalo, de traduzir conceitos mais complexos em termos simples. Foi uma satisfação muito maior do que consigo explicar.

Com o tempo, deixei de me chamar “Fernanda” e passaram a me chamar de “teacher” e, coincidentemente, nada mais foi como era antes a partir desse momento. Aliás, mesmo o conceito de “ensinar” mudou pra mim. Eu não simplesmente ensino inglês. Eu tento fazer com que os alunos se apaixonem pelo idioma, como eu mesma me apaixonei. Que vivam a experiência, que mergulhem de cabeça naquilo!

Eu torço para que um dia eu encontre aquela menina curiosa de 9 anos que quis dizer algo legal para o seu vizinho estrangeiro em uma das minhas turmas. Talvez eu já até tenha, mas num outro contexto. E esse pensamento de poder ter feito parte de tamanha descoberta, é o que me motiva a levantar da cama e preparar minhas aulas com aquele pensamento tão gostoso de “eles vão adorar essa atividade”.